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  • Foto do escritorLuiz Henrique Martins Ribeiro

Defesa de reputações online: estratégias legais

Atualizado: 3 de mai. de 2023

A internet criou o universo online, nos conectou ainda mais e trouxe uma série de facilidades e oportunidades. O avanço da tecnologia wi-fi e a revolução introduzida pelos smartphones fez também expandir o desenvolvimento e crescimento das redes sociais e aplicativos de troca de mensagens. Hoje, dificilmente conhecemos alguém no Brasil quem não tenha uma conta no Whatsapp, um perfil no Facebook, Instagram, no Twitter, Youtube, Twitch, no Tiktok, dentre muitas outras.


Porém, toda esta revolução digital, num país continental e em desenvolvimento como o Brasil, com diferenças sociais e problemas congênitos relacionados a uma cultura da alta corrupção, educação básica de baixa qualidade e pouca confiança nas autoridades, traz uma série de reflexos na forma como os usuários de redes sociais se relacionam.


Vivemos num dos momentos mais bélicos e hostis entre usuários de redes sociais no Brasil. Muito dessa situação foi crescendo a partir do olhar posicional dos usuários, em especial ante a polarização que se alastra no país, onde, por exemplo, se destaca na política (direita x esquerda), passa por movimentos sociais (conservadores x liberais), pelos meios de comunicação (rede globo x todo os outros), chegando a temas delicados, como o combate a pandemia do novo coronavírus (COVID-19), onde encontramos os favoráveis ao lockdown x que lutam pela flexibilização, e ainda tem aqueles os que se negam a usar máscaras x os que usam.


Todos estes assuntos, dentre outros, acabam sendo tratados, seja por meio de publicações, vídeos, lives, gifs, fotos e comentários nas redes sociais e nos aplicativos de mensagens. Apesar da plena liberdade de expressão vigente, conteúdos ofensivos e agressivos podem atingir a reputação e imagem de outras pessoas, levando, assim, a consequências que podem ter reflexos na esfera cível e criminal.


Reputação online


A reputação está ligada ao conceito de uma pessoa, seja ela física ou jurídica, a partir do público ou da sociedade que convive e se relaciona. Ao pesquisar vários significados em dicionários da língua portuguesa, a palavra reputação está ligada a: conceito, prestígio, fama. A reputação, deste modo, pode ser boa ou má. Em resumo, este conceito do público ou sociedade pode ser bom ou ruim, e assim, a reputação vai se construindo, seja pelo lado positivo ou negativo.


No universo online, cada dia que passa a reputação de empresas, organizações, marcas e pessoas vem se tornando mais importante, até porque hoje a grande maioria dos usuários de serviços online podem avaliar quase tudo, decidindo quantas estrelinhas ou sorrisos serão concedidos e, assim, melhorar ou não a reputação de serviços ou produtos.


A construção da boa reputação no ambiente online não é matéria simples, e para tanto, vamos utilizar como base os conceitos da metodologia RepTrak (https://www.reptrak.com/), pela qual define que a reputação se mensura com base em duas percepções (emocionais e racionais) e por meio dos seguintes critérios:


Percepções emocionais: estima; empatia; confiança e admiração.


Percepções racionais: produtos e serviços; inovação; ambiente de trabalho; governança; cidadania; liderança e desempenho financeiro


A metodologia RepTrak é focada para marcas, que podem ser institucionais (negócios e organizações) ou pessoais, ou seja, para pessoas físicas que em razão de suas atividades se enquadram como uma organização, empresa, ou centro de negócios, por exemplo: influenciadores(as) digitais, youtubers, atletas profissionais, modelos, músicos, artistas, gestores, profissionais autônomos, políticos, autoridades, dentre outros.


É justamente para estas pessoas que destinamos este artigo, passando, então, a apontar estratégias legais segundo as normas brasileiras na defesa de suas reputações, figuras estas que passaremos a chamar de personalidades, até porque suas ideias, imagem, criação, profissão, dentre outros elementos, se misturam com suas funções ou negócios e criam uma personalidade online única (marca pessoal).


Defesa de personalidades online


Como explicado acima, a personalidade online muitas vezes se distingue da pessoa por trás do mundo digital. Essa característica é muito comum no caso de influenciadores(as) digitais, youtubers, artistas, músicos e modelos, pois muitas vezes assumem pseudônimos e personagens próprios, com viés exclusivo de difusão de conteúdo online. No entanto, em outros casos, em razão da função ou profissão, algumas personalidades online não se descolam da pessoa física, como no caso dos atletas profissionais, dos políticos, autoridades e profissionais liberais (advogados, médicos, arquitetos, designers, psicólogo, etc.), porém em ambos os casos, a boa reputação online visa fortalecer suas marcas pessoais.


Importante ressaltar que já existem empresas e profissionais que prestam serviços de ORM (online reputation management) com o objetivo de fazer a gestão da reputação online de empresas, negócios ou pessoas. O trabalho consiste no monitoramento e gestão por meio de ações e reações do público no ambiente online. Este segmento de serviço vem crescendo muito, visto que não só a presença online, mas a boa reputação online vem se mostrando cada dia mais relevante.


Sabe-se que a construção da reputação online pode levar tempo e exige bom posicionamento e estratégia, contudo, no meio deste caminho, também podem ocorrer problemas, intercorrências e até mesmo ataques, cabendo então o trabalho coordenado de ORM com a necessária defesa da parte ofendida, o que na grande maioria das vezes exige intervenção judicial, e assim, necessariamente o trabalho de advogados especialistas neste segmento considerado sofisticado e que exige também boa estratégia, pois muitas vezes se litiga contra gigantes do vale do silício. Passaremos, assim, a destacar temáticas e pontos relevantes destas estratégias legais:


Identificação de perfil falso


O perfil falso, ou o chamado “perfil fake” é aquele usuário da internet, em especial de redes sociais, que não é possível identificar precisamente sua identidade, seja em razão do nome, da foto ou de demais características de registro do perfil. A legislação brasileira ainda não tipifica como crime o uso de perfil falso na internet. Este tema já vem se debatendo desde 2014 no Congresso Nacional por uma série de projetos de lei, porém até a presente data não há lei vedando esta prática.


Por outro lado, a Lei nº 12.965/2014, o chamado Marco Civil da Internet, estabeleceu que o “uso da internet no Brasil tem como fundamento o respeito à liberdade de expressão” (art. 2º), mas ao mesmo tempo, impõe uma série de regras quanto às consequências de eventuais abusos, bem como a possibilidade de identificação de usuários da rede.


As redes sociais não fornecem de forma deliberada informações de perfis para outros usuários, mesmo no caso de ataque por perfil fake, visto que o art. 10, § 1º do Marco Civil da Internet determina que “o provedor responsável pela guarda somente será obrigado a disponibilizar os registros (...), de forma autônoma ou associados a dados pessoais ou a outras informações que possam contribuir para a identificação do usuário ou do terminal, mediante ordem judicial”


Assim, o primeiro caminho a se tomar é guardar as provas dos ataques, em especial por meio do print de postagens e a gravação de vídeos quando for caso. Além disso, para evitar que a prova se perca com a simples exclusão do conteúdo pelo agressor, orienta-se a formalização de ata notarial com o conteúdo que se deseja utilizar como prova.


O segundo passo pode ser a denúncia adequada na própria rede social, e assim, seja iniciado o procedimento visando a exclusão do conteúdo e em casos extremos até mesmo do perfil falso, o que, no entanto, pode levar tempo e não trazer resultado.


A estratégia mais efetiva é buscar judicialmente a identificação do perfil por meio da aplicação do art. 22 do Marco Civil da Internet, o qual determina que: “a parte interessada poderá, com o propósito de formar conjunto probatório em processo judicial cível ou penal, em caráter incidental ou autônomo, requerer ao juiz que ordene ao responsável pela guarda o fornecimento de registros de conexão ou de registros de acesso a aplicações de internet.”


Importante destacar que este pedido em regra é prontamente deferido, pois o anonimato é vedado no Brasil, por força do art 5º, inciso IV, da Constituição Federal. Assim, apesar de existirem nas redes sociais perfis falsos, somente mediante ordem judicial as informações para identificação do usuário podem ser fornecidas, em especial o número do IP (Internet Protocol - identificação única para cada dispositivo conectado a uma rede), visto que ao mesmo tempo que a liberdade de expressão é o princípio basilar na internet, o uso desta liberdade, combinado com o anonimato, para atacar a honra, personalidade e reputação das pessoas, é vedado.


Direito de imagem e direitos autorais


Outro ponto relevante é o uso indevido de conteúdo por terceiros, prática muito comum no ambiente online, mas que pode trazer diversos reflexos na esfera legal, visto que o uso de fotografias (imagem), voz (som), vídeos (audiovisual), textos (obras intelectuais), e todo e qualquer conteúdo sem a autorização do autor, se for utilizado para fins econômicos e comerciais, ou atingir a sua honra e reputação, pode levar inicialmente a pronta retirada do conteúdo, bem como provável indenização por danos morais, podendo, ainda, constituir crime de pirataria (art. 184 do Código Penal brasileiro), dentre outros tipos penais.


Cabe explicar que o direito de imagem e os direitos autorais são distintos, porém ambos os casos têm proteção prevista na Constituição Federal (art 5º, inciso V, X e XXVII), e assim, no caso de difusão online de conteúdos sem autorização expressa, essa conduta poderá acarretar em indenização para os dois casos (imagem e direitos autorais).


Para analisar a aplicação destas regras deve-se estudar casos práticos, porém para auxiliar o entendimento, vamos utilizar como exemplo a hipótese de difusão online de uma fotografia de uma modelo sem autorização:


A modelo, por si só, tem o direito de buscar judicialmente indenização pelo uso indevido da imagem sem sua autorização e desde que observadas as regras do art. 20 do Código Civil brasileiro: “salvo se autorizadas, ou se necessárias à administração da justiça ou à manutenção da ordem pública, a divulgação de escritos, a transmissão da palavra, ou a publicação, a exposição ou a utilização da imagem de uma pessoa poderão ser proibidas, a seu requerimento e sem prejuízo da indenização que couber, se lhe atingirem a honra, a boa fama ou a respeitabilidade, ou se se destinarem a fins comerciais”.


Por outro lado, o fotógrafo, responsável pela obra fotográfica difundida sem autorização, também tem o direito de requerer judicialmente indenização, porém, com fundamento na lei de direitos autorais brasileira, Lei nº 9.610/1998, que determina expressamente:


Art. 79. O autor de obra fotográfica tem direito a reproduzi-la e colocá-la à venda, observadas as restrições à exposição, reprodução e venda de retratos, e sem prejuízo dos direitos de autor sobre a obra fotografada, se de artes plásticas protegidas.

§ 1º. A fotografia, quando utilizada por terceiros, indicará de forma legível o nome do seu autor.

§ 2º. É vedada a reprodução de obra fotográfica que não esteja em absoluta consonância com o original, salvo prévia autorização do autor.


Art. 108. Quem, na utilização, por qualquer modalidade, de obra intelectual, deixar de indicar ou de anunciar, como tal, o nome, pseudônimo ou sinal convencional do autor e do intérprete, além de responder por danos morais, está obrigado a divulgar-lhes a identidade da seguinte forma: (...)


O Superior Tribunal de Justiça (STJ) já sumulou a questão envolvendo o direito de imagem quando utilizado para fins econômicos ou comerciais não autorizados, onde definiu que “independe de prova do prejuízo a indenização pela publicação não autorizada de imagem de pessoa com fins econômicos ou comerciais.” (Súmula nº 403)


O ponto que se deve estudar em cada caso, e por isso da importância do caso prático para a devida análise, é verificar a amplitude destes “fins econômicos ou comerciais”, pois em redes sociais, este fim pode ser até mesmo indireto, ao passo a que monetização de conteúdos pode se dar de diversas formas. Ao mesmo tempo, na hipótese da imagem ou conteúdo for utilizado para atingir a honra, boa fama ou a respeitabilidade (reputação), independentemente de fim comercial, é cabível o pedido de indenização.


Condutas criminosas


Sobre as condutas criminosas na internet, a legislação traz uma série de leis que aplicam para os mais diversos tipos penais relacionados com o universo online, porém vamos destacar os crimes que estão relacionados com a honra e reputação tão somente.


O Código Penal brasileiro prevê três crimes contra a honra, quais sejam, calúnia (art. 138), difamação (art. 139) e injúria (art. 140). Resumimos cada uma destas condutas criminosas da seguinte forma: i) calúnia: atribuir falsamente a alguém a autoria de um crime; ii) difamação: atribuir a alguém um fato ofensivo à sua reputação; e iii) injúria: ofender alguém atingindo sua dignidade ou a desonrando, como um xingamento por exemplo.


Para elucidar ainda mais este tema, destacamos a campanha educativa online lançada pelo Senado Federal para que se conheça os limites da liberdade de expressão, e de forma muito didática, expôs os seus limites e os exemplos de crimes contra a honra:



Deve-se destacar, ainda, que caso este crimes sejam cometidos com uso de perfil falso, pode ainda ocorrer o crime de falsa identidade (art. 307) e, do mesmo modo, quando estes tipos penais contra a honra são objeto de diversos comentários ou compartilhamentos, se configura também o tipo penal de incitação ao crime (art. 286).


Além disso, em razão da disseminação de fake news (notícias falsas) que na grande maioria tem reflexos no mundo político/eleitoral e que pode atingir também a reputação de personalidades, a Lei nº 13.834, de 4 de junho de 2019, introduziu o art. 326-A no Código Eleitoral brasileiro, estabelecendo o crime de denunciação caluniosa eleitoral, destacando-se, em especial o seu §3º:


Art. 326-A. Dar causa à instauração de investigação policial, de processo judicial, de investigação administrativa, de inquérito civil ou ação de improbidade administrativa, atribuindo a alguém a prática de crime ou ato infracional de que o sabe inocente, com finalidade eleitoral:

Pena - reclusão, de 2 (dois) a 8 (oito) anos, e multa.

§ 1º A pena é aumentada de sexta parte, se o agente se serve do anonimato ou de nome suposto.

§ 2º A pena é diminuída de metade, se a imputação é de prática de contravenção.

§ 3º Incorrerá nas mesmas penas deste artigo quem, comprovadamente ciente da inocência do denunciado e com finalidade eleitoral, divulga ou propala, por qualquer meio ou forma, o ato ou fato que lhe foi falsamente atribuído.


Por fim, sobre as fake news, importante destacar que há o projeto de lei 2.630/2020, que busca combater a disseminação de informações falsas na internet, o qual, foi aprovado no Senado Federal e aguarda tramitação na Câmara dos Deputados para sua definição.


Conclusão


Com o aumento a cada dia da relevância da boa reputação online, e levando em conta o momento hostil e bélico em que vivemos no ambiente online, especialmente no Brasil, onde crimes contra a honra, fake news e uso indevido de conteúdos vêm se propagando, não basta uma estratégia de gestão de reputação da marca, seja ela corporativa, institucional, ou pessoal, faz-se necessário também pensar em ações relacionadas com a defesa de reputações, o que muitas vezes pode envolver até mesmo um contra-ataque, e via de regra, só pode ser feito pela justiça.




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